Inverno - Vinhos - Queijos

 

Ricardo Albergaria

 

    Há poucos dias, quando fazia o velho e conhecido percurso entre Piracicaba e Águas de São Pedro, foi que me dei conta que já estamos chegando a fim do inverno. Ao chegar a Águas observei que o jardim de uma das belas casas que costumo admirar estava tomado por cadeiras e espreguiçadeiras repletas de coloridos casacos que absorviam os últimos raios solares daquele dia. O inverno é mágico e eu o elegi como a estação do encontro, por que como a estação dos vinhos já por muitos foi eleita. Um tapete de folhas e algumas flores caídas das árvores forravam o caminho por onde um casal de velhinhos passeava de mãos dadas. Dois personagens atemporais de Águas de São Pedro, gerados num fim de tarde numa sempre eterna adolescência. Deixei meu olhar se perder ao observar o poente avermelhando da paisagem que se preparava para o recolhimento e, minha mente transmutou-se em várias invernais reflexões. O inverno da vida, o ocaso, a ponderação dos dias. Crepúsculos se perdem entre equinócios e solstícios. E entre quedas de flores e folhas o aconchego de uma boa mesa repleta de uma boa gastronomia e de bons vinhos torna-se convidativo.

    Segui para o Curso de Sommelier do Senac, um pouco mais romântico e mais leve. Mas o final de tarde, os velhinhos enamorados que ainda possuem a magia do passeio de mãos dadas e o final deste inverno maravilhoso não abandonavam meus pensamentos. Como não se imaginar sentado sob um caramanchão, ao fim de uma destas tardes iluminadas por discretos raios solares, em boa companhia e aproveitando o prazer de degustar de excelentes vinhos e queijos. Uma das épocas mais impulsivas para se tomar vinhos é o inverno, onde o frio é aquecido por essa tão prazerosa bebida/alimento, que na maioria das oportunidades vem acompanhada por uma bela gastronomia e/ou por deliciosos queijos. A arte de combinar queijos e vinhos já vem desde a época de Cristo, quando os vinhos eram servidos com alguns pães e queijos produzidos artesanalmente. É claro que a harmonização entre eles não era o foco da união, mas o gosto dos sabores já demonstrava certa satisfação.

    Atualmente nos deparamos com uma grande variedade de queijos e vinhos e, portanto, a proposta deste artigo é avaliar suas características e complexidades individuais, para posteriormente pensarmos em uma harmonização.

    Característica dos queijos em geral: Sabor intenso, alguns tipos são mais fortes, a maioria apresenta um grande teor de gordura, pode possuir uma acidez elevada, algumas variedades são salgadas ou muito salgadas, pode ter uma textura viscosa que reveste o interior da boca.

    Características em comum entre o queijo e o vinho: O queijo como o vinho em termos de qualidade varia muito de produtor para produtor e em relação ao tempo de maturação os dois podem ter uma maturação rápida ou prolongada.

    Categoria dos Queijos: Assim como os vinhos os queijos também possuem seu grupo de divisão:

    Queijos duros; Parmesão, Grana Padanno, Sbrinz, Asiago, etc. Essa é a linha mais ampla em termos de harmonização, esse grupo consegue se harmonizar bem com diversos tipos de vinhos brancos mais estruturados e tintos secos de meio a muito encorpado.

    Queijos macios; Ementhal, Gouda, Edam e Masdamm. Essa é a linha mais complicada, talvez a mais difícil de combinar, pois geralmente alguns queijos dessa linha possuem muita acidez e gordura, que precisam ser harmonizados com uma ligeira atenção, para que não se sobressaia sobre os vinhos. As principais indicações são vinhos brancos de maior estrutura e complexidades para queijos como o Brie como os Borgognes ou tintos de maior complexidade para queijos como Cammenbert como os Bordeaux de St. Emilion ou Pomerol.

    Queijos Azuis; Gorgonzola, Roquefort e Stilton. Esse grupo faz ótimas parcerias com vinhos doces/licorosos, provocam grandes contrastes positivos com o paladar salgado do queijo e juntamente a doçura intensa do vinho.

    Queijos de cabra; Pouca Maturação, Média Maturação e Muita Maturação. Esse grupo se encaixa muito bem com vinhos confeccionados da uva Sauvignon Blanc, geralmente com grande acidez, como os Poully-Fumé ou Sancerre. Quando muito maturado a tendência segue para grandes tintos de Shiraz, tais como os bons Australianos carnudos.

    Queijos Defumados; Ricota temperada, Provolone Defumado e Variedades Defumadas. Esse grupo precisa de vinhos que completem as características de notas mais complexas, como o defumado, tostado e picante, os vinhos mais indicados são os Gewurztraminers da Alsácia bem condimentados e estruturados ou os potentes Shiraz da Austrália.

    Assim, após esta ligeira explanação sobre as possíveis combinações queijos/vinhos, só posso aconselhar a você amigo leitor, que mesmo não tendo um caramanchão, procure por alguns bons vinhos e alguns bons queijos, convide sua amada ou seu amado, sente-se tranquilamente ao final de uma destas tarde invernais, esqueça às horas e os compromissos, e aproveite deste momento, que embora não devam, estão se tornando cada vez mais raros em nossas vidas.