CHILE - TERRA DOS VINHOS - VALE DO COLCHAGUA - Capitulo 4

 

Ricardo Albergaria

 

         O nome Colchagua é de origem Mapuche e sua pronuncia original era Colchahuala, que significa “o lugar onde habita a Huala”, ave sagrada e venerada por este povo indígena. Está localizado no coração da zona central do Chile, dividido em 10 comunas, Chimbarongo, Placilla, Chepica, Nancagua, Santa Cruz, Palmilla, Peralillo, Lolol, Pumanque, e San Fernando que é a capital da província. Suas terras fazem fronteira com as províncias de Cachapoal ao norte, Curicó ao sul, Argentina a leste e Oceano Pacífico a oeste. A principal atividade econômica é a agricultura, destacando-se a vitivinicultura como o seu eixo do desenvolvimento. Atualmente são 23.000 hectares de vinhedos finos, sendo a segunda maior Denominação de Origem do país em superfície plantada, e a primeira no Chile quanto à plantação de uvas de variedades finas de origem francesa, como Cabernet Sauvignon, Carmenère, Malbec e Syrah.

            Durante nosso passei/degustação por este Vale conhecemos mais de perto quatro vinícolas. Iniciamos pela Viña Las Ninas, onde fomos recebidos pela enóloga Laurence Real, que nos levou para conhecer os vinhedos e as instalações de recepção das uvas, produção e armazenamento dos vinhos. Em 1996, quando a família Dauré realizou uma viagem ao Chile e Argentina, voltaram convencidos que o Chile era o local ideal para a produção de grandes vinhos. Crentes disso passaram a trabalhar na procura pelo local mais adequado, viajando pelo Chile desde o Vale de Casablanca mais ao norte até o Vale de Curicó ao sul, acabando por eleger o Vale do Colchagua, que lhes pareceu ser o melhor “terroir” do Chile. São oito mulheres (Sabine – fundadora, Estelle – presidente, Laurence – enóloga, Regine, Alix, Margaux, Germaine e Emma) todas irmãs, filhas ou netas de Sabine, que administram a vinícola, que possui 160 hectares plantados com as cepas Syrah, Mouvedre, Carmenère, Cabernet Sauvignon, Chardonnay e Merlot. Após as apresentações históricas e técnicas, terminamos nossa visita junto a cave repleta de barricas de carvalho francês, onde degustamos cinco vinhos: Las Niñas Reserva Chardonnay, Las Niñas Reserva Cabernet Sauvignon, Las Niñas Reserva Syrah, Las Niñas Reserva Carmenère e o Tacon Alto. Todos os vinhos apresentaram bom corpo, personalidade, estrutura e equilíbrio. O Tacon Alto, o grande vinho da Las Niñas é um corte de Syrah (80%) e Merlot (20%), de coloração vermelho escura, aromas de eucalipto, amora, framboesa, estrutura rica e densa com taninos redondos e elegantes que lhe dão personalidade e concentração. Um vinho surpreendente

            A segunda vinícola que visitamos foi a Viña Montes, que nasceu em 1987, após dois sócios, Aurélio Montes e Douglas Murray resolverem montar uma vinícola que tivesse por princípio a produção de vinhos de qualidade. Em 1988, se uniram aos dois sócios originais, Alfredo Vidaurre e Pedro Grand, cada um trazendo qualidade e conhecimentos complementares distintos e necessários. Nasceu a Viña Montes, inicialmente denominada como Discover Wine Ltda., que atualmente conta com mais dois sócios: José Antonio Garcéz e Sérgio Barros. O vinhedo se localiza em uma área formada por escarpas com inclinação de 45º, cujas plantações estão voltadas para o sul, o que dá as videiras uma exposição solar suave. A temperatura nesta área tem uma amplitude térmica diária de 150C (30ºC a 15ºC), o que permite uma lenta e melhor maturação das uvas. São 127 hectares plantados com as cepas Cabernet Sauvignon, Carmenère, Syrah, Merlot, Cabernet Franc y Petit Verdot. Atualmente introduziram a cepa Mouvedre em caráter experimental. Sou suspeito para falar a respeito destes vinhos, pois se trata de alguns dos meus preferidos. Degustamos os vinhos: Monte Alpha Pinot Noir, Montes Alpha M que é um corte de Cabernet Sauvignon (80%), Merlot (10%), Petit Verdot (5%) e Cabernet Franc (5%), Montes Cherub que é um rose da cepa Syrah, Montes Limited Selection que é um corte de Cabernet Sauvignon (70%) e Carmenère (30%), e por último o Montes Late Harvest, um corte de Gewurztraminer (50%) e Riesling (50%). Estas cepas são atacadas pela botrytis cinérea que provoca a desidratação dos bagos deixando-os com alto teor de açúcar. Este último vinho é utilizado para acompanhar sobremesas. A qualidade destes vinhos é indiscutível e, quem ainda não teve o prazer de degustá-los, deve fazê-lo com certeza.  

            Logo após nossas despedidas, rumamos para a Viña Porta que nasceu em 1954, quando a família Gutiérrez-Porta chegou ao Chile, vinda da Espanha, e instalando-se no Vale do Alto Cachapoal. Em 1997 a Viñedos e Bodega Corpora SA comprou a Porta que atualmente se encontra estrategicamente localizada nos vales do Aconcagua, Maipo, Alto Cachapoal, Colchagua e Bio-Bio. Tivemos a oportunidade de estar visitando as instalações do Vale do Colchagua que devido às condições microclimáticas com grandes amplitudes térmicas diárias mais as condições do solo de textura média franco-arenosa contribuem para uma ótima maturação das uvas e alta concentração e personalidade dos vinhos, em especial os produzidos com as variedade Carmenère, Syrah e Cabernet Sauvignon. Nesta vinícola, não provamos nenhum vinho produzido com as cepas do Vale do Colchagua e sim um do Vale do Curicó e três do Vale do Aconcagua: Porta Select Reserva Chardonnay (Curicó), Porta Gran Reserva Syrah (Aconcagua), Porta Gran Reserva Cabernet Sauvignon (Aconcagua) e o Limited Cima Cabernet Sauvignon (Aconcagua). Todos os quatro vinhos são considerados grandes vinhos desta vinícola, sendo que o Cima é considerado um vinho ícone. Todos os vinhos apresentaram bom corpo, estrutura adequada e equilibrados.

             Terminamos nosso dia visitando a Viña Casa Silva, uma vinícola familiar, onde cada membro participa ativamente da administração e manejo diário dos negócios. Família esta que se sente orgulhosa de sua história que começou em 1892 com Emilio Bouchon que idealizou e implantou a vinícola, que hoje é administrada pelos seus descendentes (sexta geração), os irmãos Mario, Francisco e Gonzalo. Fomos recebidos por Gabriela que nos conduziu em uma visita técnica pelos vinhedos e caves. Algumas destas caves são centenárias e resistiram aos recentes tremores de terra na região. Nelas é possível encontrar vinhos preciosos de alto valor histórico, sendo que alguns já passaram da casa dos cem anos. Após esta experiência dentro de caves com chão de terra, paredes brancas e temperaturas baixas, fomos para a sala de degustação. Um amplo salão com um grande mesa antiga rodeada por cadeiras entalhadas a mão, e uma decoração lembrando os velhos castelos franceses. A empresa produz vinhos brancos e tintos varietais de diferentes níveis, tendo um nível básico, reserva e gran reserva nas variedades tinto Merlot, Carmenère, Cabernet Sauvignon e Syrah, e nas brancas Sauvignon Gris, Sauvignon Blanc, Chardonnay, Viogner. Além desta linha básica são produzidos o Quinta Generación Branco (blend de Chardonnay, Sauvignon Gris e Viogner), Quinta Generación Tinto (blend de Carmenère, Cabernet Sauvignon, Syrah e Petit Verdot), e o seu vinho Altura (blend de Cabernet Sauvignon, Carmenère e Petit Verdot). Os Quinta Generación e o Altura como qualquer grande vinho, em sua elaboração, existe um alto grau de sofisticação desde sua colheita e seleção de uvas, bem como resfriamento em câmara frigorífica, maceração em frio e fermentação em barricas especialmente desenhadas. São vinhos sem nenhum tratamento nem filtração.

            Assim encerramos nosso passeios pelas vinícolas do Chile, um país que nos encantou não só pela qualidade de seus produtos vinícolas, mas também pelas maravilhosas paisagens e a educação de seu povo.