CHILE - TERRA DOS VINHOS - VALE DE CASABLANCA - Capitulo 3

 

Ricardo Albergaria

 

        Casablanca tem experimentado um grande crescimento na vitivinicultura nos últimos anos, resultado da criação de circuitos turísticos, restaurantes e lojas de vinhos. O vale, localizado entre Santiago e o maior porto do Chile, Valparaíso (recentemente declarado Patrimônio da Humanidade) combina todas as condições para tornar-se uma referência do setor vinícola. A influência marítima que o vale recebe faz com que a temperatura média seja moderada, alcançando não mais do que 200C, com uma variação térmica entre o dia e a noite de 190C. Isso cria condições excelentes que se refletem na frescura e no intenso aroma cítrico de seus vinhos.

       Atualmente a região possui 3.693.000 hectares de áreas plantadas com cepas viníferas, sendo as mais comuns a Pinot Noir, Merlot, Syrah, Carmenère, Chardonnay e Sauvignon Blanc, que são cultivadas por 25 grandes vinícolas instaladas no vale, entre as quais figuram Morandé, Quintay, William Cole, Emiliana, Indômita, Casas del Bosque, Casablanca, Veramonte, Viña Mar, entre outras.  A produção de vinhos nessa região é muito recente, e tem como figura principal o enólogo Pablo Morandé. Sua família tinha (e ainda tem) uma propriedade nesse vale e ele chegou à conclusão de que eram muitas as semelhanças com o clima de Carneros, na Califórnia, berço de grandes vinhos notadamente feitos com a cepa Chardonnay. Casablanca fica próximo ao Oceano Pacífico, de onde vêm as brisas frias e também a névoa, que funciona como um moderador do clima. Em 1982, enfrentando ceticismo de muitos, plantou 20 hectares nessa região fria e com água racionada; nascia então, um dos melhores vales produtores de vinhos brancos do Chile.

Iniciamos nosso passeio/degustação pela Viña Veramonte que possui os vinhedos contíguos mais extensos do Chile, com uma superfície de 450 hectares. Em 1990, Agustín Huneeus escolheu este local para instalar a Viña Veramonte, que hoje em dia utiliza os últimos avanços da tecnologia vitivinicultora para produzir uvas da mais alta qualidade. Após explanação e visita às instalações da vinícola, fomos conduzidos em uma degustação com cinco vinhos: Sauvignon Blanc Reserva 2006, Chardonnay Reserva 2005, Pinot Noir Reserva 2005, Merlot Reserva 2005 e o Primus um corte de Merlot (47%), Cabernet Sauvignon (30%) e Carmenère (23%). Os quatro primeiros vinhos apresentaram uma boa intensidade de cores e aromas e com corpos e texturas com certa complexidade. Já o Primus apresentou-se com uma coloração púrpura intensa, profunda e densa, aromas de pimenta negra e branca e notas de tabaco. Na boca, um vinho poderoso, contundente com notas de frutas maduras e cerejas que se mesclam aos taninos intensos e suaves. Um vinho que me surpreendeu pela qualidade.

Após nossas despedidas do grupo que nos assessorou na Veramonte, partimos em direção a Viña Emiliana.  Em Casablanca a Emiliana conta com 117 hectares e junto a Cordilheira mais 32 hectares. Ambos os vinhedos se situam no Vale de Casablanca e se localizam a uns 40 km ao sudoeste de Valparaíso. São vinhedos dedicados ao cultivo e produção de vinhos orgânicos, que são refrescados pela névoa matutina e a brisa do Oceano Pacífico. Possuem solos altamente permeáveis, principalmente francos, arenosos e com escassez de matéria orgânica. Estas características permitem que as uvas amadureçam lentamente, o que faz destes vinhedos grandes produtores de vinho branco de intensos aromas e excelentes sabores. Fomos conduzidos por Gabriela para conhecer as instalações e as vinhas; e entre os vinhedos, gansos, patos, galinhas de angola e alpacas fomos introduzidos em um outro conceito de se fazer vinhos. As aves são utilizadas para comerem as pragas e insetos que atacam as vinhas. Já as alpacas foram introduzidas para pastarem entre as vinhas consumindo todo mato que ali cresce. Trata-se de manejo sustentável, onde não se usa defensivos agrícolas no controle dos vinhedos. Minha filha Ana Cecília teve a grata satisfação de poder alimentar com mamadeira um filhote de alpaca (“Pepa”) enquanto tomávamos vinhos entre os vinhedos. Na degustação nos foram servidos seis vinhos que nos surpreenderam pela qualidade: Sincerity Sauvignon Blanc 2005, Sincerity Chardonnay 2005, Adobe Chardonnay 2005, Adobe Cabernet Sauvignon 2004, Adobe Carmenère 2004 e o Coyam 2003, composto pelas cepas Syrah (39%), Cabernet Sauvignon (24%), Carmenère (24%), Merlot (20%) e Mourvedre (2%). Todos os vinhos apresentaram uma qualidade muito boa, com colorações intensas, aromas persistentes e encorpados e com textura complexa. O Coyam apresentou presença de taninos firmes, porém suaves e redondos que dão ao vinho concentração, estrutura, complexidade e personalidade.

A seguir fomos visitar a Viña Morandé – Campo de Belén. De longe uma das três melhores recepções que tivemos. As outras duas foram na Undurraga (Vale do Maipo) e a Emiliana (Vale de Casablanca). Este campo da Morandé está localizado em pleno Vale de Casabalanca, no setor de Lo Ovalle, e atualmente conta com 130 hectares plantados. Logo na nossa chegada fomos recepcionados pela Chef do Restaurante “House of Morandé”, Gloria Silud, que nos conduziu em uma harmonização de pratos maravilhosos e vinhos fantásticos: “Trilogía de Ceviches acompanhada pelo vinho Terrarum Reserva Sauvignon Blanc, Luhy com purê de habas e ensalada de cous-cous harmonizado com o Terrarum Reserva Pinot Noir, Risotto de uva e o vinho Terrarum Reserva Carmenère e por fim o Filete de Vacuno acompañado de Purê aromatizado al ajo com o vinho Terrarum Reserva Cabernet Sauvignon. Pratos e vinhos fantásticos que durante a harmonização propiciam sabores e aromas indescritíveis, que exigem a presença do degustador, de corpo e alma. Sentados em uma ampla varanda junto aos vinhedos, degustando destes pratos e vinhos, senti que a poesia pode ser materializada. Um dos grandes momentos da minha vida enogastronômica.

Logo após esta experiência maravilhosa na Morandé, fomos visitar a Viña Mar, que se localiza no quilômetro 78 da rota 68 que une Santiago a Valparaíso e Viña del Mar. Situada a 40 km do Porto de Valparaíso, e a 18 km em linha reta com o mar, a influência marítima se faz sentir em seu terroir, produzindo vinhos bastante frutados e com discreto sabor salgado. São 274 hectares plantados com as cepas: Sauvignon Blanc, Chardonnay, Pinot Noir, Merlot, Cabernet Franc e Carmenère. Quando da nossa chegada fomos recepcionados por Miguel que nos levou ao prédio central, onde nos deparamos com uma arquitetura, acabamento e beleza que deixa qualquer mortal apaixonado. Ainda não consegui esquecer a beleza dos lustres que adornavam o teto do prédio. Tudo muito branco, limpo e fresco. Após as explanações sobre a história da vinícola e a visita a suas instalações e vinhedos, fomos conduzidos a uma degustação com mais cinco vinhos: Sauvignon Blanc Reserva Especial, Chardonnay Reserva Especial, Pinot Noir Reserva, Cabernet Sauvignon Reserva e o Espumante Viña Mar Brut. São vinhos de uma qualidade superior, com aromas intensos, bastante frutados e de corpo médio.

Após as visitas e todos os 20 vinhos tomados, achamos mais prático ir para Viña del Mar do que retornar a Santiago. Acabamos chegando por volta das 21:00 horas e após uma longa procura por uma vaga em hotel, tomamos banho e fomos dormir, para no outro dia levantarmos cedo, aproveitarmos um pouco de Viña del Mar e Valparaíso, duas belas cidades junto ao Oceano Pacífico.

Abraços e até semana que vem com o último artigo sobre o Chile: Vale de Colchagua.